22/11/2006

Fenomenologia do usuário de rotina


Tropeço numa lata. Lâmpada. Roço-a. Eis que exsurgem três gênios-gêmeos de Sião. Sendo assim, só pude desejar uma vez. E das ferragens-âmago solicito uma Hering branca básica. Acordo sob a reverberação de vinte cinco minutos para chegar ao escritório.

– Lambão: penteia o cabelo. Barbeia o lanugo. Tira essa camiseta amarrotada. Todos vão perceber que você dorme com ela. Vai assim: com essa calça jeans velha e essa sandália de vovô ridícula? Vai trabalhar com a bunda suja assim? Veja se isso é postura-traje de doutor-pai-de-família? Seus colegas andam im-pe-cá-veis: engravatados, perfumados e com bóton da OAB. Desleixo demais da conta. Os clientes se vestem melhor que você. Acha bonito ser minimalista. Acorda! Pegando frango ainda vai, mas manchada na bunda?
– Suja, muito? Sujei na igreja.
– Lá vem: larga de perseguir a igreja!
– Digo a verdade, pacóvia: fui à missa de formatura da menina. Devo ter manchado a bunda no banco em que me sentei, presunçosa de campana, dona Caracucarador, noveleira sonoréxica: estressada demais, você! E começa e não desconfia e não pára nada. Pega no pé não, pega no pau, glamour girl de quermesse! Às favas! Agora você vai me ouvir vai me ouvir ah se vai: aquele almanaque de jacus lacrimejando não sensibiliza deus nenhum não. Ouça. O pranto só tem a função de lubrificar as engrenagens do inferno. Uma vida religiosa constitui uma possível via existencial, jamais sucesso metafísico. Aliás, a gravata decapitou o sucesso. O terno asfixiou a naftalina. E nada contra música sertaneja, muito menos nada contra contrapor-me a ela. Não consigo me lembrar se maconha provoca lacuna mnemônica. Não há nada mais democraticamente diluído que as vias de acesso a um mesmo tédio dominical. Prefiro arte geniosa a genial. Aforismo despojado tem a espontaneidade da blasfêmia legítima. Por mais longeva que seja a vida útil da obra visionária, ela sempre estará prosseguida de um ponto final. A maior proeza humana é conseguir se emudecer voluntariamente. O que atesta – ouça – a qualidade vaginal é justamente seu perfume peniano. O que entra por vias audiovisuais dói mais que o que entra por vias anais. O que jamais queda em disfunção é o tesão pela elegância patológica inerente à didática da compaixão proselitista. Não é o sábio que tem a cabeça sob o sol e o sapato grã-fino na sombra, mas sim quem tem a cabeça na sombra e o par de chinelos (ou sandálias) sob o sol: descalço, nem um deus. Olha, e sobre marica, saiba: o que faz a cabeça não é a maconha, e sim o Durepox. O melhor da mulher é justamente onde sai o pior. Pessoas não são interessantes: oferecem coisas pelas quais nos interessamos. Nenhuma abstração saldou minhas dívidas, nenhuma filosofia vale a ressaca pós-Balalayka genérica. Ninguém pode pagar por uma dívida que a humanidade contraiu. Kardec não mencionou: espíritos reencarnam porque parcelam divindades. Verdade existente bem pode ser a existência de representação. Por favor, dona, não me convide para apreciar verdades estacionárias professadas em saliva estanque. De um lado, o antólogo-paçoca, porta-voz da geração aldogão-doce, recrutando quem se vale de prelúdio, prólogo, prefácio, sumário, vinheta, interlúdio, poslúdio, epílogo, posfácio, apêndice, glossário, nota de rodapé, citação e dedicatória bilíngüe, ufa, todos esses issos destinados a um único haicai, inspirado por uma divindade-glicose analfabeta. Do outro, a imprensa-valsa convidando para o baile de debutante da Lei 11.343/2006, anacrônica desde o manifesto beatnik. Não. Desde o clube dos haxixeiros parisienses inaugurado por Baudelaire. Nietzsche e eu temos uma ressaca em comum, embora ele se valha da metáfora da dinamite, e eu me identifique com a da esponja. Compre um litro de vinho Chapinha e ganhe dois litros-diarréia. O tema proposto configura fim de discurso. Ilustrar uma divindade através duma figura antropomórfica equivale a representar a serpente do Éden a uma tripa abádica, empapuçada com o corpo-passa. Com essa estória de liberum arbitrium deus ensaboou suas mãos. Por que deus (isso, com “D” minúsculo) é um anfitrião a anunciar uma farra dentro do céu inteiro? Todos sabem que basta um barraco para acomodar seus (com "S" acanhado) felizardos: menos ele, logo o detentor da onisciência! A morte repara o erro vivente? Não. Daí exsurge (ressuscitaram a palavra) um jesusinho (homenagem a Caio Fernando Abreu mesmo), como se tudo tivesse sido resolvido. Ora. Promessa de recuperação atesta protelação. Depois da merda irreversível feita, não interessa o tamanho do bode expiado. Uma única gaiola comporta toda a hoste celestial. Ora. Pra que idéias-rubi se tenho despautérios-criptonita? Ninguém apanhou dalguém sem receber uma surra do medo antes. Melhor um morcego na mão que dois batmen espetados na churrasqueira de Ozzy Osbourne. Um remédio faixa preta nocauteou a reencarnação de Wong Fei-Hong. Literatos dissecam um algodão-doce no intento de se conhecerem melhor. Não logram êxito. A inspiração carece de formol, senão apodrece. Em vez de se atentarem às blasfêmias que fazem jus à fundamentação histórica, social e moral, o cortiço de deus deveria se preocupar e dirigir sua censura compenetrada rumo a seus enteados e pombas-chinfrim pornograficamente inspirados pelo vinho extraído de seu próprio poço artesiano, cuja cristalina elegância-sanção soa, destoa e destrona a mais legítima blasfêmia. O estilo aqüoso de Chico Alvim desafia a calmaria de um chamariz de dengue. Faculta abstrair de sua eugenia-paquiderme versículos-blasé. Adiciona tão nada que permite haurir um milagre qualquer. Tão completo como uma tábula rasa ou um quarto escuro: lugares-comuns onde qualquer boçal projeta interpretações das mais espalhafatosas sem nada além do senso-instinto de divagação. Aceclas alegam que o cônsul-Beja omite a ranhura da própria garganta enquanto emite recortes-averbação duma sociedade-cabaré. Vejo nele mosaicos-senzala, um golpe-retórica tão populista quanto manuelbandeiristamente kukluxklânico. Não incorporo pombas-gira e sim cornucópias-pirueta. A olheira delata o olheiro, a paisagem a aptidão do binóculo. O oásis a vida útil da clepsidra, a realidade o quanto o leque aventa o efêmero. Não dê vazão à raiva da locução interior: apenas seja fiel ao desconcerto por ela provocado. Zippo é chique, sofisticado, aparato dândi, mas sua chama ainda tosta com rusticidade. Os complexos de Édipo e Peter Pan tentam abafar o instituto do incesto. Doenças têm meu sintoma. Paulo Coelho foi à Rússia e eu sequer saí de casa. Ouviu, estressada-faladeira? Solta. Nah. Deixe-me caminhar pois hoje é segunda-feira e nas segundas-quartas sou gênio de pequenas causas. Tchau filhote. Alguém viu meu isqueiro?

7 comentários:

Anônimo disse...

Sempre que tenho o prazer de te ler é uma reação qu experimento. INfelizmente não é sempre que leio, por falta de tempo e de internet. Boa sorte doce vagabundo. Adoro seus escarros. Valeu

Anônimo disse...

Hehehehehehehhehehehehhehehe...


Teatro de verve e fisofia de maldição, isso num tempero refinado e bem escrito.
Sou seu amigo, mas preciso dizer um lance:

TUA ESCRITA É CORTANTE...

Mas não só corta, questiona,problematiza e choca... Na província isso é grade.

Ainda bem que a liberdade é que vale e que faz a produção.

Grande abraço.

Paola Vannucci disse...

Gosto de vir aqui te ler......


bom dia

Paola

Ricardo Wagner Alves Borges disse...

O estresse atenua
Na medida que o texto flui
Rumo ao boom.

Anônimo disse...

Brother,

Passando pra te deixar um abraço. E dizer que o novo visual daqui tá massa!Muito bom!

Anônimo disse...

se o genioda lampada te encontrasse acho q vc q iria conceder os pedidos dele.
abraçao.

Anônimo disse...

se o genioda lampada te encontrasse acho q vc q iria conceder os pedidos dele.
abraçao.