07/03/2008

Alma: geme-a!

.
.
À Samantha Abreu e sua haute intimitè
.
.
Quando eu o conheci, descobri na cara que já era tarde, porém possível, deixar de ser mulher. A fortaleza estampada nas tetas maternas seduzia filhotes desmamados; a buceta pantanosa abominava a existência de penetrações bucais e conjurava ginecologistas esfomeados; o útero gaguejava recuo diante de mini-blusas; o leitor estéril amarrava sua esposa inflável na cama e a xingava de meu nome. Sabe, quando eu o conheci, carregando na bolsa uma garrafa de Toda Hora barriguda de pinga e com um Cramulhão em conserva dentro, logo após a separação definitiva, decorridos oito anos de enlace enrodilhado no pulso do Terço da Misericórdia (sim, e rezei todas as novenas disponíveis pra não perdê-lo de vista), ele me advertiu dos nódulos de uma esquizofrênica morar sozinha (com o álcool).
.
– Não faça besteira, por favor; não beba, imploro. (___) se você suicidar eu morro! – latejava sua preocupação aparvalhada por uma fr_q___ada por excelência em quinta versão de última instância.
.
Uma garrafa de plástico e um amassado 2000 ouviam minha confissão – deus tem mais o que fazer quando está à toa. Seu celular tocou. Ele se afastou imediatamente de mim pra atender. Flagrei dele um robusto oiii. Logo depois voltou.
.
– N'estou com ninguém, n'sei quem telefonou, n'apareceu o número no visor. A-a ligação de-deve ter caído.
.
– Ha! – espumei de posse – Todo celular tem identificador de chamada; quem ligou?; (___) arrumou outra, né? Suprimido? Ai, maldita cólica!
.
A fim de afugentar o efeito insuportável da minha neura (melhor acreditar assim, embora de modo algum consentisse: leis de atração não funcionam pra quem não tem atração por leis), solicitei um salão onde rolava música _____ônica, serviam chope de requeijão, uma iguaria com a mesma textura, portanto sabor não tão gostoso quanto o de uma merda de criança em risco, e um motorista lisinho, por conta da casa, que jamais me atendia por conta inteira.
.
Uma das clientes cochicha pra trinta, ao mesmo tempo, a única fofoca. Aciona o inferno crônico, isto é, potencializa-o assim, pois como saber onde se enfiou a saída pra tal inércia? – a dinâmica restante grudou em meus seios inchupáveis que me permitem permanente a partir de um eterno então. Sou mulher mais não. Reduzi o lábio leporino vaginal (via antiga colpoplastia). Cortei a franja. Fiz o bigode (de Hitler). Demiti estrias. Chutei o balde, a sociabilidade, a sogra, o pau. O sovaco, tanto faz. Agora de touca (embalagem de alumínio pra marmitex), peço licença a ____________________ e pego o banheiro pelo colarinho. Abro a bolsa. Pego um cartão. Confiro umas trezentos e setenta e cinco vezes e meia se havia trancado a porta. Escancaro a torneira pra emudecer a fungada. Cheiro uma gorda branquela de Zyprexa moído e pêlos deitados no mármore. Sento no vaso. Ponho o dedo pra verificar o grilo do grelho. Um caroço, espichado no dedo, acusa-me. O pó na ponta do dedo indicador se suja quando coço o cu com o elástico da calcinha. Deixo a assadura empolgada. Os seios gemem na altura da alma. Nada de lembrete menstrual – sangro só depois do dia vinte! Dobro a barra da calça (saias?, as pernas, após a gestação de algo que me confunde quando diz que sou eu próprio, arrebentam palmas) – a animosidade do jeans estrangula a circulação. Meu dedo ao lado do dedão desobedece à sandália. Alguém bate à porta. O Prestobarba me consola, antes de ver sua cegueira. Levanto-me com as calças no joelho. Abro a porta sem perguntar quem chama – pois sabia de tato que era eu mesmo quem havia batido. Ele, que sempre me era enquanto não me conhecia, malgrado eu nunca ter me encontrado antes de calça arriada ou de xota em pé, beija-me o queixo e enfia o dedo na minha boca.
.
– Como uma mulher tão feia pode ficar sozinha, por q...? – daí interrompo com bafo de pinga (já não escovava mais os dentes nem metia um Halls, desde o fora recebido de Marcello Mastroianni) que não trepo com bicha muito menos com mulher (___)! Subo as calças. Ele alerta que falta terminar o corte. Embolo a calcinha e a jogo no ______. Mentira: penduro-a na maçaneta, do avesso, pro consumo do próximo. Saindo, sigo sua ligação e ouço, do lado de lá, um oiii rechonchudo: ele me chifrava com o mesmo cara com quem eu o traía, longe das dificuldades lineares do espaço-tempo seqüencial (esse), quase o tempo todo, ou com tempo de sobra pra mais.
.
– Você é burro mesmo, hein, seu burro?; peruca não cresce, ô, burro! – respondi em cheio, abusando de sinônimos.
.
Ele se parece monstruosamente comigo, porque me evita pelos olhos. Agarra-me pelo cabelo e implora pra aceitar cortá-lo: apesar de ali ser tardio, ainda era possível que eu não me enforcasse nele. Desumanamente dócil, explico que havia decidido, por excesso de escolhas, atribuir sentido àquele Prestobarba, porque saudade significa medo de partir, e apego ao passado pune o futuro pelo fígado. Quando eu me conheci, era arrependimento demais pra ser tarde e o salão fechou dentro do banheiro.