10/09/2008

Amigos


Eu os amo como amo os desgraçados que censuram meu xingatório; como o demônio Zé Buceta que me proíbe de blasfemar; tal qual os que esparramam suas tragédias e suicídios modulares: como válvula de escape dum bem-sucedimento insuportável.

05/09/2008

Céu e inferno: do simplismo maniqueísta unilateral à variabilidade cíclico-conceitual (beta)

Inferno e céu de fato existem. Do ponto de vista empírico, psíquico, moral, social e politicamente falando – e a visão não se encerra em tratados teológicos recalcitrantes centrados num estudo do post mortem. Inferno e céu existem sim, mas não se os admite apenas numa acepção preventiva preconizada pelas tradições judaico-cristãs e afins, notabilizadamente de modo coercitivo e unilateralizado. Tanto a dor gerada por um inferno quanto a ocasionada por um céu se realizam, estão comigo, no mundo real dos supostos vivos. Lugares de fácil acesso, o inferno e o céu só não são bem-vindos pelos vícios decorrentes de ciências matemáticas vulgares, as quais os consideram dois números, um par, dois fatores, dois conceitos. Tem-se aparentemente a noção de que, quando se aborda o céu e o inferno, há o ato de se deter em coisas numeráveis, pois a linguagem assim os determina ao descrevê-los. Sei, parece absurdo, mas céu não diz respeito a uma só idéia-número nem inferno a uma outra e tampouco as duas, quando somadas, representam apenas duas coisas. Também deve ser repreendida a noção de que ambas as coisas se excluem sob a fidelidade da proporção antagônica de cunho maniqueísta, ou lei vaga da atração dos opostos. Aqui, a matemática não adentra; em contrapartida, a lógica, daqui, nunca se retira.

Céu e inferno constituem pessoas; pessoas são lugares os quais se freqüenta, visita – compulsória e invariavelmente. Não se experimenta um lugar-indíviduo abrindo-se mão da elasticidade de cores, cadências e símbolos. Céu e inferno são, a certo ponto, lugares adiáveis, mas nunca evitáveis. Valendo-se da explicação pela via metafórica, céu e inferno são becos-transeuntes. Sim, becos móveis; lugares sem saída e ao mesmo tempo em constante e ininterrupto movimento. E em expansão, tal qual o crescimento demográfico. Sendo assim, infere-se, provisoriamente, que um incorpora o outro, isto é, um conceito absorve o outro, e na mistura alquímica supostamente feita a dois, um sobressai. Diante da impossibilidade de não adentrar tais lugares-gente, não se pode recuar do seguinte conceito: céu e inferno (que não formam um único par) se fundem numa só pessoa. Todavia reitero: esqueça-se, por ora, a função numérica de soma e subtração, pois quando faço alusão a esta pessoa-lugar, falo de algo expansível tal qual o tempo – e este é vagamente adestrado pelos números elementares do relógio, pois o tempo também não tem explicação razoável, e toda explicação baseada em exatidão chafurda em convenções, em necessidades transitórias criadas a fim de auxiliar verdades imperfeitas.

O célebre café, ainda ebuliente, de Sartre (“O
inferno são os outros.”) carece de reestruturação formal, pois apresenta deficiência semântica e denuncia imprudência ontológica: não se sabe ainda apurar quem de fato inferniza quem: o céu ou o inferno?; se o inferno são os outros (alude a outros infernos ou a outros céus?), ocorre por que toma-se por céus ou infernos estes outros? Ora, nem mesmo o verbo “ser” favorece o esclarecimento. Não seria mais preferível, no caso, empregar o inferno “é” os outros a o inferno “são”, haja vista que, se ainda não se pode precisar o que uma coisa é de fato, conseguintemente não se vê sentido em descrevê-las valendo-se de verbos numéricos (verbos de ligação conjugados no plural)? Nsc. ‘xa pra lá... Noutro rumo, penso também que não só o inferno inferniza, levando-se em conta o fato de se estar diante de terceiros, posicionando-se à frente dum céu-lugar magistralmente cíclico, tal qual o inferno-pessoa a me circular. Se não posso escapar do céu nem do inferno, já estou condenado, e se condenação pressupõe inferno, não há céu algum. Paraíso seria transitar entre um e outro. Aqui, então, e afinal, é o Éden também, no sentido de se oscilar entre um e outro indivíduo-lugar. Mas o maior inferno de todos se dá diante da linguagem e do fato de não ser possível evitá-la. Não há nenhuma possibilidade de se estar diante de algo anterior à linguagem.