06/08/2008

TPM

Enquanto tragava minha bituca, chupava um café e digladiava com o remorso por ter sapecado uma formiga com a brasa, comecei a pensar “como posso ser tão cruel por ter feito isto com uma mísera formiga?”, “se ela é mesmo mísera, qual o problema em queimá-la?”, “ela bem que mereceu: quem mandou nascer insignificante?”, “se é mesmo insignificante, por que me fixo tanto nela?”. Ideações absurdas vinham futucando cedo. Decerto um desespero meio kafkaniano causado pela inoportunidade de anotá-las as tumultuava ainda mais, pois que as neuronóias surgiam no ambiente de trabalho, em frente ao chefe e eu tinha que registrá-las de qualquer jeito e eu não tinha peito pra isso e aquilo e enfim desisti de escrever isto. Márcia Denser (não vou pôr linque, se vira no Gúgou!) está coberta de razão quando assevera que o ato de escrever precede muita coisa considerada importante (pelo leitor-leitor) e, no fim da parada, a gente está cara a cara com uma bosta de Documento 1 – Microsoft Word, maldosamente peladinho. Maldosamente peladinho porque tudo o que é nu, branco e vazio mete uma respeitosa arbitrariedade – ainda mais quando, sozinho, converte hífen em travessão. Escrever é foda. Messs. Mas não tem nada de prazeroso no final das contas. É doença. Transtorno Psiquiátrico Maior. Quem escreve está sempre com qualquer coisa, em formato de brasa, infernizando a cabeça. Só não inferniza tanto porque não inferniza apenas a cabeça da gente.

10 comentários:

Unknown disse...

O termo grego páthos se refere às afecções ou doenças, este também pode ser traduzido como paixão,ou seja, afecção, aquilo que afeta. Só discursamos ou fazemos considerações sobre os que nos afeta em algum sentido, logo somos movidos pelo pathos, vítimas do pathos, sofremos pelo pathos... Então o melhor a se fazer é afogar o pathos! Escrever é, de fato, um sofrimento, uma doença, uma paixão ou uma afecção na alma, sinônimos para o que você nomeia como TPM.

Anônimo disse...

O maior sofrimento ao transpor para um papel - ou documento do word - aquilo que nos perturba é não conseguir reproduzir fielmente os nossos anseios (o que na grande maioria das vezes acontece), e ver que a inquietação não acaba, não pára por aí, torna-se constante, sempre faminta, querendo sugar-lhe todas as energias, sem poupar tempo nem lugar, inconvenientemente. Torna-se um vício seu, o qual você não teve escolha, ou, se preferir, oportunidade para se defender. É o TPM. O amor que consome e dilacera, mas ainda assim, é Amor.

Paulo Castro disse...

Juliana:
Obrigado por falar sobre "páthos". Eu sempre tenho "termos" gregos na manga pra comer mulher. Mas quando qualquer mulherzinha passa a citar os termos gregos que uso, está na hora de mudar de termos, ou de grelos.
Deixe ver o que tenho aqui na manga do anel...hum....episteme. Ju, guarde essa. É ótima. Em Aristóteles, designa menos um corpo (ui) de conhecimento do que a chamada "dignidade".
É exatamente em termos grelos dessa dignidade que te esculacho um pouco as entradas ( Maldito Livro das Citações), pela minha dignidade não tenho um pingo (ui) de educação ( sentimental) e pela dignidade do texto de RW assim faço ressonância.
Ou serão dignos os budistas que para não matarem uma formiga, ficam de quatro e vão assoprando a bunda das ditas ( quer Juliana ?) até que cheguem ao quintal do mosteiro ? Sim, sim, sim, hiper-moderninose cerácea, teu quintal cerebral é teu paraíso de ego, doçura. E quiça nem chegar ao termo chauvinista, sem saber o que diz, Juliana, sou antes de tudo xanista, tanto que brilhei olhinhos de sensibilidade, tosse e cerveja Theresópolis quando li ali ( baba baby baba) o nome de Márcia Denser, amigona de um dos meus poucos avôs, o Paulo Francis. Que Francis, que farra ! Que termos ! Que dignidade.
Agora, assim, tudo claro e sem preconceito, ajoelhe-se e chupe-nos, Juliana.
°

Paulo Castro disse...

Nossa, não tinha baixado o treco e visto que ainda tem uma Letícia !!!
E ainda mais com anseios !!!!
Para Lucy, remedio com um Sky with Diamonds.
Para Letícia e todo esse amor amor amor amor ( que medo !), é um engov antes e um raticida depois.
°

Samantha Abreu disse...

E nesse fato todo sobre escrever, como disseste bem, doença, eu me pego pensando em um detalhe: na formiga. Nela e na porra de existência, injusta, singular e, por vezes, insuportável.
Quem de nós (transformadores de pensamento/angústias em textos/palavras) não gostaria de ser a ponta do cigarro?
Não dá uma puta vontade de ser a brasa? De queimar a valer. De fazer inexistência, nossa de outros?
Pois, se querer tudo isso é sintoma de doença... escrever é, sim, um câncer. E maligno. Acho que não tem nada a ver com Amor. Tem a ver com dor. Uma puta dor: nossa, cigarros que somos, e de quem é sapecado, formiga. E note que não estamos em estado imóvel, muito pelo contrário: vezes queimamos, outras queimados. Como a insignificancia da mísera formiga.
Isso, pra mim, é produção textual genuína.

Beijo-te, meu amor.

Anônimo disse...

Bem o diga!
Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é! E isso não é nenhuma teoria hippie não!
E pelo jeito tem mais gente querendo saber:
- Por que (man)te(r)mos um pé em cada mundo? -
Sabe-se lá se n'algum ponto dessa loucura toda não estamos mesmo todos empatados?
Nenhum de nós tem a resposta.
Beijo

Cássio Amaral disse...

matou a pau ou a fogo!

escrever é re-

ver a própria existência e sabatinar o peso da alma.

beijo.

Anônimo disse...

Só vim cobrar minha mordida-arrepio.
Não tô com saco pra ler os comentários e nem fazer um maior ainda dizendo que eu também sei escrever bonitinho, sei nada!
Mas confesso que gostaria muito de aprender...
Enfim, só vim cobrar minha mordida-arrepio.
Atrás do quarto pé de amora, depois da casa azul, às 16h.

Nana Magalhães disse...

boca seca, palpitações, dores de cabeça, isso é o de menos. pior é dor lá no fundo, ego ferido e pá.

tem remédio pra isso mesmo, paulo? sei não.
o documento de word assim como uma cama vazia.
dependência.
bom demais, ric.
pra variar.
beso! ;*

Daniel Rodrigues Gomes disse...

Quando começo a escrever sinto uma grande euforia. Quando termino me dá uma baita tristeza. Quando me leio, então!, dá vontade de desistir dessa porra. Se existisse alguma outra coisa que eu soubesse fazer. Pensar nisso não é nada saudável - foi o que me disseram.